A Câmara dos Deputados concluiu a votação do segundo e último projeto que regulamenta pontos centrais da reforma tributária, como a gestão e a fiscalização do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e regras do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD). O texto agora segue para sanção presidencial.
A proposta aprovada é, em sua maior parte, um substitutivo do Senado ao Projeto de Lei Complementar (PLP) 108/2024 e representa o segundo texto de regulamentação da reforma tributária.
A seguir, veja os principais pontos e como eles impactam empresas, consumidores e setores específicos da economia.
O que é o IBS e como será administrado
O IBS foi criado para substituir dois tributos atuais:
- Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), cobrado pelos estados;
- Imposto sobre Serviços (ISS), cobrado pelos municípios.
Comitê Gestor
A arrecadação, fiscalização e distribuição do novo imposto ficarão a cargo do Comitê Gestor do IBS (CG-IBS), formado por representantes da União, estados e municípios.
Entre as atribuições do comitê estão:
- Coordenar a arrecadação e a fiscalização do IBS;
- Definir metodologia e cálculo da alíquota;
- Distribuir os recursos entre os entes federativos.
Na prática, a ideia é simplificar o controle: um único auditor poderá acompanhar a situação fiscal de uma empresa em todo o país.
Transição de alíquotas
De 2027 a 2033, as alíquotas do ICMS e do ISS para financiar o funcionamento do Comitê Gestor do IBS cairão de forma escalonada. O cronograma será o seguinte:
- Até 100% das alíquotas atuais em 2026;
- Até 50% em 2027 e 2028;
- Até 2% em 2029;
- Até 1% em 2030;
- Até 0,67% em 2031;
- Até 0,5% em 2032.
Financiamento da União ao Comitê Gestor
Devido à arrecadação menor no início da vigência do IBS, a União financiará as despesas de instalação do Comitê Gestor entre 2025 e 2028, com até R$ 3,8 bilhões:
- R$ 600 milhões em 2025, proporcional ao número de meses de instalação;
- R$ 800 milhões em 2026;
- R$ 1,2 bilhão em 2027;
- R$ 1,2 bilhão em 2028.
A partir de 2029, o Comitê Gestor ressarcirá a União com recursos da arrecadação do IBS. O projeto permite destinar para essa finalidade um adicional do IBS de até:
- 1% em 2029;
- 0,5% em 2030;
- 0,33% em 2031;
- 0,25% em 2032;
- 0,1% de 2033 a 2038.
O comitê também poderá utilizar rendimentos de aplicações financeiras de receitas próprias para quitar o adiantamento.
Split payment: como funcionará
O Comitê Gestor será responsável pelo sistema de split payment, que permitirá o registro automático de compras e vendas das empresas. O modelo é semelhante ao da declaração pré-preenchida do Imposto de Renda, reduzindo erros e sonegação.
Alíquota zero para medicamentos
A proposta altera a regra atual sobre medicamentos com alíquota zero de IBS e Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Em vez de uma lista fixa, será adotado um modelo mais flexível.
O Comitê Gestor do IBS e o Ministério da Fazenda, com consulta ao Ministério da Saúde, deverão publicar a cada 120 dias uma lista de medicamentos isentos.
A isenção valerá para remédios destinados ao tratamento de:
- Doenças raras ou negligenciadas;
- Câncer;
- Diabetes;
- Aids/HIV e outras ISTs;
- Doenças cardiovasculares;
- Medicamentos do Programa Farmácia Popular.
Continuam isentos:
- Medicamentos adquiridos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) ou por entidades filantrópicas que prestam serviços ao SUS;
- Soros e vacinas.
A mudança busca evitar judicialização e permitir atualização mais rápida da lista.
Futebol: tributação mantida para SAFs
As Sociedades Anônimas do Futebol (SAFs) continuarão com a tributação atual. A Câmara rejeitou o aumento previsto na primeira lei da reforma:
- Tributação mantida em 3% (em vez de 8,5% a partir de 2027);
- Entidades desportivas também terão redução de 60% das alíquotas gerais.
Bebidas açucaradas e bebidas vegetais
- A Câmara rejeitou o limite máximo de 2% para o Imposto Seletivo sobre bebidas açucaradas, que não terá teto de alíquota;
- Bebidas vegetais, à base de cereais, frutas, leguminosas, oleaginosas e tubérculos, terão redução de 60% nas alíquotas dos novos tributos.
Plataformas de venda on-line
Marketplaces e plataformas digitais poderão ser responsabilizados solidariamente pela arrecadação de tributos caso o vendedor associado não emita nota fiscal.
Pessoas com deficiência: mudanças na compra de veículos
Ampliação de benefícios fiscais:
- Valor máximo do veículo com desconto sobe de R$ 70 mil para R$ 100 mil;
- Prazo para troca do veículo com benefício cai de quatro para três anos.
ITCMD
Cobrado sobre doações e heranças, o ITCMD teve seus pontos regulamentados no projeto:
- Alíquotas obrigatoriamente progressivas, conforme o valor do bem transferido;
- Cada unidade da Federação poderá fixar alíquotas, respeitando teto definido pelo Senado;
- Para bens móveis, títulos ou créditos, a competência será do estado de domicílio do doador ou do falecido;
- Para bens imóveis, o imposto será vinculado ao estado de localização do bem;
- Base de cálculo equivalente ao valor de mercado do bem transferido.
ITBI
O Imposto sobre a Transmissão de Bens Intervivos (ITBI), cobrado pelos municípios, também foi regulamentado:
- Municípios poderão aplicar alíquota menor se o contribuinte antecipar o pagamento na assinatura da escritura, inclusive para imóveis na planta;
- Base de cálculo passa a ser o valor venal, em vez do valor da venda individual.
Sistema financeiro: novas alíquotas
Para serviços financeiros, a soma das alíquotas de IBS e CBS será aplicada de forma gradual entre 2027 e 2033:
- 10,85% em 2027 e 2028;
- 11% em 2029;
- 11,15% em 2030;
- 11,3% em 2031;
- 11,5% em 2032;
- 12,5% em 2033.
Durante a transição, haverá reduções temporárias caso IBS, CBS e ISS sejam cobrados simultaneamente:
- Redução de 2 pontos percentuais em 2027 e 2028;
- 1,8 ponto percentual em 2029;
- 1,6 ponto percentual em 2030;
- 1,4 ponto percentual em 2031;
- 1,2 ponto percentual em 2032.
Administradoras de programas de fidelidade, como milhas aéreas, passam a seguir o mesmo regime tributário do sistema financeiro.
Importação de serviços financeiros
Foi mantida a alíquota zero na importação de serviços financeiros ligados a:
- Operações de câmbio;
- Emissão de títulos;
- Captação de recursos no exterior.
Em contrapartida, empresas do regime regular não poderão gerar crédito de IBS e CBS em operações de empréstimos referenciados em moeda estrangeira. A medida busca evitar a transferência da base de cálculo dos tributos para fora do país.
Próximo passo
Com a votação concluída na Câmara, o projeto segue para sanção do presidente da República. As novas regras fazem parte da transição para o novo sistema tributário, que será implementado gradualmente nos próximos anos.



